"Abrati representa cura": como uma experiência pessoal virou impacto coletivo
- Associação Brasileira de Apoio à Terceira Idade
- Sep 23
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matéria completa aqui : https://lupadobem.com/sociedade/abrati-terceira-idade/ Autor: Gabriela Amorim
setembro 18, 2025

Fundada por Álvaro Sena Filho, a associação transforma experiências de vida em ações concretas para promover autonomia, saúde e pertencimento na terceira idade.
A Associação Brasileira de Apoio à Terceira Idade (Abrati) nasceu de uma história pessoal marcada pela dor, mas que se transformou em propósito. Isso porque o fundador, Álvaro Sena Filho, enfrentava um período de depressão quando se deparou com a realidade de crianças em situação de extrema vulnerabilidade. Aquele contato, como ele relembra: “Mexeu comigo, porque eu tava em uma depressão, mas não tinha um motivo. Eu percebi que havia pessoas muito mais frágeis do que eu, e mesmo assim seguiam em frente”.
Foi desse choque de realidade que surgiu a semente de um projeto maior. Inicialmente, Álvaro estruturou um centro de apoio para crianças em tratamento de câncer na cidade de São Paulo, mas as dificuldades financeiras inviabilizaram a continuidade. De volta ao interior, em Barão de Antonina (SP), ele percebeu, ao ajudar a própria mãe com o celular, que a tecnologia podia ser também uma barreira — e uma oportunidade. “Ali nasceu a ideia de ensinar idosos a lidar com a tecnologia. E eu vi o quanto isso podia transformar vidas”, conta. Assim, a Abrati se consolidou como espaço de inclusão digital e de acolhimento. Os primeiros computadores deram lugar às salas cheias de alunos, e logo a associação ampliou suas atividades. Oficinas de informática se somaram às aulas de pintura, inglês e, posteriormente, práticas de exercícios físicos e atividades culturais. “A felicidade das pessoas me contagia. Ontem mesmo ouvi de uma aluna: ‘Álvaro, eu estava com depressão e fazer as atividades me ajudou muito’. É isso que dá sentido ao projeto”, relata.
A Abrati se estrutura em três pilares fundamentais: saúde física, saúde emocional e saúde espiritual. Na saúde física, são oferecidas oficinas de yoga, pilates, karatê intergeracional, dança e ginástica funcional. No campo emocional, entram o apoio de psicólogos, rodas de conversa, teatro, coral e artesanato. Já a dimensão espiritual não está ligada à religião, mas ao sentido da vida. “Para mim, espiritualidade é se sentir útil, enxergar a vida como algo além do individual. É isso que dá paz interior”, explica Álvaro.
O impacto se reflete no aumento da autoestima e no fortalecimento da autonomia. Idosos que chegam retraídos ganham confiança, ampliam sua rede de contatos e se engajam em novas atividades. Essa mudança ajuda também a combater o etarismo, uma das bandeiras centrais da associação. “A sociedade ainda enxerga o idoso como alguém limitado. Nosso papel é mostrar que envelhecer não significa perder potência, mas acumular sabedoria e contribuir de novas formas”, afirma o fundador.
Em 2023, após a pandemia, a Abrati enfrentou um de seus maiores desafios financeiros. Foram meses de dívidas acumuladas e um esforço pessoal de Álvaro, que chegou a lesionar o ombro durante reformas voluntárias. Mas a resiliência prevaleceu. “Acredito que os desafios vêm para nos fortalecer. Hoje atendemos mais de 300 pessoas e seguimos firmes, mesmo com todas as dificuldades”, diz. Um dos projetos mais emblemáticos é o “Conectividade”, que ensina tecnologia a idosos em quatro módulos adaptados a diferentes níveis de conhecimento. Do básico do touch screen ao uso de aplicativos e serviços digitais, a metodologia é reconhecida como referência em inclusão digital. Além disso, a Abrati mantém iniciativas ligadas à sustentabilidade, como coleta de recicláveis e óleo usado, garantindo parte da manutenção do espaço.
Outro destaque é o projeto “Intergeracional”, que reúne crianças, jovens e idosos em atividades conjuntas. O objetivo é quebrar estigmas e construir novas referências entre as gerações. “Se uma criança cresce achando que toda pessoa idosa é chata, vai carregar esse preconceito na vida adulta. Nosso papel é mostrar a riqueza das trocas entre idades diferentes”, comenta Álvaro.
A Abrati também atua em políticas públicas, participando de editais e parcerias com instituições como a Prefeitura de São Paulo, o Instituto Pinheiros e universidades como a São Camilo. A associação se coloca como uma rede aberta: projetos de terceiros podem ser acolhidos e desenvolvidos dentro de sua estrutura, fortalecendo iniciativas diversas de impacto social.
Com essa atuação multifacetada, a associação não apenas oferece acolhimento e oficinas, mas projeta o futuro. A população brasileira está envelhecendo rapidamente, e até 2030 haverá mais idosos do que crianças de até 14 anos, segundo o IBGE. “Se não dermos autonomia para o idoso, se não os recolocarmos no mercado de trabalho, a sociedade não vai se sustentar. O país vai depender do público 60+, e precisamos prepará-lo para isso desde já”, alerta Álvaro.
Esse olhar estratégico reforça a missão da Abrati: ressignificar o envelhecimento. Ao contrário da visão de perda, a associação aposta no envelhecer como fase de crescimento, aprendizagem e contribuição social. “A Abrati, para mim, representa cura. Não é sobre dinheiro, é sobre ser útil, criar impacto positivo na vida de muitas pessoas e dar propósito para a própria vida”, afirma o fundador.
Hoje, Álvaro vê na própria trajetória um reflexo da transformação que deseja para outros. “Eu comecei esse projeto aos 24 anos, e cresci ao lado dos idosos. Isso fez um bem danado para mim. Acredito que pode fazer bem para qualquer pessoa. Envelhecer não é fim, é mais uma fase. E a Abrati existe para mostrar que cada fase pode ser plena e cheia de sentido”.
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